sábado, 22 de junho de 2019

Ipanema. Foto Fernanda Correia Dias

Para onde vamos? Vamos para Ipanema, vou passar na casa de uns amigos e amigas, deixar uns presentes nas portarias, mas depois voltamos para cá. Como está a Senhora? Estou bem, Altair, mas com uma saudade imensa da minha mãe e uma vontade de comer o frango com quiabo que ela fazia só para mim e para ela.
E por que a Senhora não faz e come? 

Vi a cara do Altair quase colada na minha! O corpo todo virado para trás do carro! Aquela manopla dele em cima do encosto do assento do carona! Os olhos saltando da cara!
Por quê? 
Ora... Altair! Porque não aprendi. Ela me ensinou a fazer bolinhos de arroz crocantes, chuchuzinho picadinho em quadradinhos mínimos, com mini camarões para comer com arroz branco de alho e sal, como ela fazia e outras maravilhas, mas frango com quiabo... não...E eu adoro! Também não aprendi a fazer os livrinhos, que  ela fazia naquele tamanho de micro-livro, cabendo dentro da concha da colher de sopa!E não aprendi a fazer a canja de hortelã, tomates, galinha, batatas, arroz e cenouras, que ela me trazia quando eu estava muito fraquinha...
Livrinhos? 
É, Altair! Ela fazia tripas,dobradinhas, cortadas em retângulos, que abríamos como livrinhos. Com salsas, rodinhas de cenouras, cebolas, toucinho, feijão manteiga , louro! Ai, que saudade da comida da minha mãe!
Mas é muito fácil, fazer o frango com quiabo, Dona Fernanda!  
Ah, Altair, você não me conhece... Eu escolho uma receita num livro, leio e faço. Dá sempre certo,fica sempre ótimo, porque os autores são ótimos, mas... se não tiver o livro aberto, não sei fazer não... Mas eu gosto de ler receitas, como poesias... Sou diferente dos meus irmãos que cozinham muito bem. São mesmo excelentes na gastronomia. Eu as vezes sei fazer tudo, e chego na cozinha e faço comidas incríveis e bolos, doces e biscoitos fantásticos e no fim, não explico como fiz, porque nem eu sei. É uma outra  alma, uma outra Fernanda que me habita e que sabe mais do que eu, e que cozinha com minhas mãos! 
Mas para todo dia, sou eficaz na decoração do ambiente, da mesa, das cadeiras, das luzes, com as porcelanas, as travessas, guardanapos,  arranjos de flores, música...sou rápida, inteligente, sensível e pratico o bom gosto! Daí, que quando a comida não é tremendamente elaborada, ela fica deliciosa com a soma da beleza do ambiente. Nisso eu sou muito experiente e eficiente.
As comidas que eu mais gosto, são na maioria, as feitas pela a minha mãe. E essas, eu não domino todas. E sei que meus irmãos também não sabem fazer como ela fazia. Porque ela era muito singela. Singular. Enxuta.
Uma comida de hospital! Meus irmãos diziam. Com assepsia, água, alho, cebola e sal. 
Mas eu gostava! Foi assim que aprendi e comer tomate com gosto de tomate, batata com gosto de batata... compreende?E ela me ensinou a gostar dos gostos que as coisas tem. De vagens, todas as folhas, abobrinhas e berinjelas, quiabos, bertalhas, essas coisas maravilhosas da natureza e que a maioria não sente nenhum prazer. Eu sinto,prazer no gosto específico de cada legume, tuberculo, vegetal, grão...
Então. Por gentileza, pare aqui. me espere. Vou deixar com aquele porteiro.

E assim seguimos até o momento que Altair me diz que ele vai me ensinar a fazer frango com quiabo.
Dona Fernanda, a Senhora vai no mercado e compra quiabo. Lava. Corta em rodelinhas, põe numa panela com água e com uma colher de pau, vai rodando a colher. Põe o escorredor de macarrão dentro da pia e quando a baba do quiabo estiver pesando para rodar a colher, pega a panela com quiabo e vira dentro do escorredor de macarrão, que está aguardando, dentro da pia. A baba desce e a Senhora devolve o quiabo para a panela e põe água e leva ao fogo novamente. Duas vezes, as Senhora tira a baba. Depois em outra panela, faz seu tempero, corta o frango em pedacinhos e leva o quiabo para cima do frango. Vai rodando a colher de pau. Põe a tampa da panela, deixa tomar gosto, prova e desliga o fogo. Faz um arroz de alho e serve os dois juntos!
Só isso Altair? Simples assim?
Tá... então me leva para o estacionamento desse supermercado e me espera que eu vou lá comprar o quiabo.
Quando encontro com os quiabos, vejo a manopla num quiabo e uma voz atrás da minha cabeça, me dizendo: Eu vim aqui, Dona Fernanda porque se a Senhora não souber escolher o quiabo, minha receita vai dar toda errada!
Escolher como?
Olha para a minha mão: pegue o quiabo e com o polegar, force o rabinho do quiabo para o lado. Se der um estalido e quebrar, vai para a panela. Se não estalar, não leva!

Escolhi como ele me explicou. Morri de rir com a presença dele, garantindo que tudo daria certo.
Deu.
Fiz exatamente como ele ensinou. Ficou ótimo. Comi tudo. Ficou igualzinho ao quiabo da minha mãe, Maria Mathilde. Igual.
Meu tempero para o frango é colocar junto no fundo da panela e antes do frango:
cebola, alho e sal.


Fernanda Correia Dias
in Altair e a receita de quiabo para suavizar 
as saudades da minha mãe. Maria Mathilde.
Ou, o carinhoso Altair!



2 comentários:

  1. O subtítulo poderia ser também "De como o amor dá jeito em tudo. (Ou quase)" ❤️ Um beijo, Fernandinha ❤️

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  2. Verdade, Telma! Altair é muito querido mesmo, muito cuidadoso comigo.Dá mesmo jeito em tudo, com amor!
    Eu penso também, que o meu sincericídio me ajuda muito. Se me perguntam como estou, sempre estou bem próxima ao meu real sentimento. Não me afasto. Não me automatizo nem me cubro de formalidades. Isso, quase sempre me salva de tudo, inclusive do que poderia me atrapalhar muito. É mesmo uma característica que herdei de minha avó Cecília Meireles. Uma espécie de par de asas musculosas e muito visível. Minha mãe também herdou. Incomoda a alguns. Mas ser assim me deixa mais perto da vida verdadeira, onde gosto de estar. Não sou a moça da ficção. Sou mais a do instante.
    Ah... que saudades suas, Telma!!! Como estão os trabalhos? Conte-me sempre!
    Beijo em você, no amor e nos trabalhos!!!
    Fernandinha

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