quarta-feira, 20 de junho de 2018

Coração de filigranas . Foto Fernanda Correia Dias
Coração de filigranas . Foto Fernanda Correia Dias


As palavras, as palavras nos cercam, nos libertam, nos representam...
Mas as palavras, também  poluem e envenenam. 
Até o dia que você sonha e sonha com um vento imenso que chega por trás de você, como esse que eu sonhei. E é um vento tão forte, eficaz, que ele assopra por trás de você e tira de dentro do seu coração - como se fosse um cardume de peixes fugindo de dentro do seu peito - todas as palavras poluídas e envenenadas.
E é tão eficiente este acontecimento, que você acorda para dizer a si mesmo:  Estavam em mim e se foram.
As palavras se foram, atravessaram evaporadas as filigranas de ouro do meu coração.
Não eram minhas.

Virão outras palavras, eu sei. Mergulharão, eu sei, mas também essas fugirão para longe de mim, porque não são minhas, não eram minhas, não foram, nunca serão e nunca me pertenceram ou pertencerão.
Portanto, aviso aos navegantes, as palavras são assim: Elas te cercam, te atrapalham, te atravessam, te envergam, mas se não são suas, não te matam, nem te quebram.
As suas te levantam, te erguem e te elevam.
Só meu coração fiel ao esplendor da gratidão na minha vida, sabe, irriga e alimenta a  flor florida, que me habita e suas raízes,  fios vivos de ouro.
Filigranas, inacreditáveis histórias.
Oh! minha vida! Oh! Magnólia!


Fernanda Correia Dias
in Coração de Magnólia

domingo, 10 de junho de 2018

Lirio branco . Foto Fernanda Correia Dias
Lírio branco . Foto Fernanda Correia Dias

Novalis escreveu que poetas e sacerdotes originalmente eram uma só pessoa e as épocas posteriores os separaram. O poeta autentico sempre foi sacerdote e o sacerdote autentico sempre permaneceu poeta. Somente um artista pode adivinhar o sentido da vida. O poeta entende a natureza melhor que o cientista.
E Cecília escreve na minha alma: O sentido está guardado no rosto com que te miro. (Canção/ Cecília Meireles)

Guildo Ceronetti  em Correlate,  aquele que toma a palavra, entusiasta, aquele que chama a assembléia...nada de novo sob o sol e é :  “vaidade das vaidades, tudo é vaidade. Canção dos birds ” Turn, turn, turn, every season, turn "  “ fumo, fumo, tudo é fumo”...Mas Cecília responde em meu coração: Não tenho inveja às cigarras, também vou morrer de cantar (Aceitação/Cecília Meireles)  ou Aprendi com a primavera a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira! (Desenho/Cecília Meireles)

Bhagavad-Guíta: Levamos uma replica do cosmos dentro de nós
Ah... Cecília é uma mulher de olhos verdes. Fala universalmente , com uma vivacidade indescritível de coisa bela, fala três vezes mais e traz o triplo de respostas que nós.  Mostra a mais viva inteligência e a compreensão para ligar as atmosferas. Sempre em estado de poesia, a beleza do espírito, a vida voltada ao conhecimento, a criadora e a autora de si mesma. Quando Árpád Szenes pintou à cores e à óleo, o retrato de Cecília Meireles, deu o título: A Poesia.
 Ela escreveu em Motivo na minha vida: Não sou alegre, nem sou triste: sou poeta.

Fernanda Correia Dias
in Alvuras em aroma de lírio branco




Conversinha bordada de beija-flor e borboleta .
foto Fernanda Correia Dias
Conversinha bordada de beija-flor e borboleta .

foto Fernanda Correia Dias

Que é isso que assim me aperta o peito? Minha alma quer sair ao infinito ou  a alma  do mundo que quer entrar em meu coração? Rabindranath Tagore


      Quando a minha mãe bordava eu ficava impressionada como ela conhecia o caracol, as gramas e cada pedaço do caule da rosa em espinhos!
Como conhecia os beija-flores? as asas das borboletas?
As pétalas e a suavidade dos botões, naquele ton-sur-ton que me ensinava a ver melhor uma rosa, um caracol, cada vez que eu tinha a oportunidade de estar com eles. Ela bordava a terra parecendo terra, o carneirinho com pelo de carneirinho, os passarinhos com suas cores de penas esplendorosas. Minha mãe trazia um bastidor com aquele tecido que ela chamava de pele de ovo desenhado com lápis que ela desenhou, mas as cores...as cores...ela ia pintando com linhas...

      Eu ajudava fazendo uma tarefa dificílima para ela e muito importante, eu enfiava os fios de seda  na argolinha da agulha. Ficava encostada na mamãe, olhando de pertinho ela enfiar a agulha me explicando que aqui era o bico do passarinho... ela precisava do beje, ali eram as asas, ela via onde estavam as cores, o pescoço do passarinho e o olhinho dele, ela bordada, aquele olhinho vivo... o passarinho só tinha cabecinha, olhinhos e uma asa, mas já estava vivo!

       Minha mãe bordava os dedinhos dos passarinhos e eu via até as mínimas unhas... Ela avançava e cobria o que tinha desenhado à lápis com linhas lindas de seda... Ela sabia as cores que o mundo pintou os passarinhos, as flores, os filhinhos dos beija-flores. Ah... ela me mostrava a mamã beija-flor dando comidinha aos filotinhos no ninho....Ela mesma era uma mamã beija-flor!  Dizia para eu fechar os olhos e abrir a boca, e metia um delicioso caramelo de leite na minha boca... ou uma bala de amêndoa! Depois minha mãe me mostrava uma linha dourada e uma prateada... e me pedia para colocar na agulha para ela... duas agulhas, uma para cada fio... Então ela ia colocando aquele pinguinho dourado ou prateado onde ela antevia que era o lugar certo e ficava lindíssimo...Ficava perfeito e ela pedia para eu cortar com a tesourinha aquelas linhas que sobravam e eu cortava. Ela me fazia sentir importante ao lado dela e sabia que eu estava aprendendo e que ela estava me ensinando.

      Muitos criticavam minha mãe quando viam que ela estava bordando ao meu lado...  Que perigo! Com essas agulhas! Vai causar um acidente! E eu olhava aquelas pessoas e a minha mãe que respondia: Ensino aos meus filhos tudo o que eles precisam saber. Não vão se machucar, não! Sabem usar as agulhas e as tesouras, sabem cortar linhas e bordar, esticar no bastidor o tecido com desenho para bordar!
Eu sabia que minha mãe estava falando a verdade. Para nos tirar o medo ela picava o próprio dedo dela para vermos que não machucava como diziam.



     No dia que ela ganhou o premio de bordado, como destaque de :O bordado mais belo, era um ramo de flores  e frutinhas, que ela tinha feito até as frutinhas com linhas  e eram penduradas aos ramos...Eu fiquei muito contente de vê-la tão contente! Tia Elvira disse para a mim: Fernandinha a sua mãe sempre bordou muito bem , desde muito pequena, quando ainda estávamos no tempo do Lafaiette (escola que ela e as irmãs estudaram). Sempre foi uma perfeição.

     Anos mais tarde tia Elvira me explicou assim: a mãe da sua avó Cecília, também chamava Mathilde e foi o nome dela, Mathilde, que a minha mãe deu à sua mãe! A Mathilde sua mãe, que nós chamamos de Matuchinha borda como a Mathilde. A Mathilde, mãe da sua Avó Cecília, além de professora, bordava tão bem que ganhou o concurso de bordado do Palácio e passou a ser a especialista nos bordados da Princesa Isabel. Quando a Mathilde morreu, a Cecília tinha 3 anos, mas o bordado com o São Cristóvão atravessando as águas, ficou no bastidor colorido, inacabado e pendurado na cama dela... Uma perfeição. 
E na minha também. Eu mesma pendurei, sem saber que tinha sido bordado por ela.



     Agora quem bordava, era eu e fazia um bordado imenso e em seguida uma camisa que eu vestia no dia seguinte para ir para a aula na faculdade, na Gávea.
Minha mãe ficava perplexa com tanta beleza! Não acreditava que eu tinha sido a autora do bordado. Me dizia: Você está brincando ! Está brincando comigo...
Eu não estava. Tenho até hoje várias camisas que bordei. Todos queriam comprar as camisas...até se eu quisesse vender as que eu estava usando. Vendi porque os compradores não se conformavam que eu não fizesse para venda. 


Para minha surpresa, ganhei o quimono de seda preta, com o dragão que Mathilde bordou e que minha avó Cecília usava...Ganhei da minha tia Elvira. Magnífico. Quando cheguei em casa e mostrei para minha mãe, contei sobre o presente da tia Elvira e a mamãe me disse: Ah... eu me lembro desse quimono, meu amor, merecido! Qualquer dia desses crio um site com as histórias e fotografias desses objetos que estão na minha vida!



Fernanda Correia Dias
in  Conversinha bordada de beija flor e borboleta




A vida e a eternidade . Foto Fernanda Correia Dias
A vida e a eternidade . Foto Fernanda Correia Dias

Não te disseram que era você que tinha que fazer as coisas existirem? Que você tinha esse poder? Que o mundo não nasceu pronto? Que tudo está para ser criado e recriado no seu tempo e que você deve agir? Não te disseram que isso é o que funciona? Que não se pode impor nada à ninguém, sem que esse alguém fique condenado ao que não descobriu para si e por si mesmo? Então? Neste instante eu estou imersa em memórias estruturantes que me assopraram brisas aglutinantes, sopros construidores, palavras tão lucidas e transparentes e que eu visto, uso e alimento a minha anima. E respiro e transpiro. E, essas pessoas envolta de mim, que me querem bem até hoje, me ensinaram o que estou te ensinando, porque sei como e o por quê me ensinaram: eu me interessei, quis aprender.
Olhe para mim ali, pequena olhando as pessoas envolta de mim e respondendo, quando perguntada, o que você vai ser quando crescer. E respondo: Grande! E todos se entre olham e me dizem: Isso! Isso! Mas... vais trabalhar com o quê? Ora, ora vocês não vêem? vou ser poeta e bailarina! Vou ser o que eu mais gostar de fazer, aquilo que mais me fizer feliz e que sei fazer bem, não é não? É sim! Vou dançar as grandes músicas, vou dizer e escrever o que tiver saindo da minha cabecinha, e isso é que é a vida, não é? Se eu sou feliz fazendo isso, todos vão compreender o que eu faço e quando precisarem de mim, vão me chamar para eu fazer mais para eles e eu vou fazer... mas para isso eu vou dançar mais, escrever mais, desenhar mais, pintar mais, costurar mais, tocar mais pianinho, violão, violinha, flauta, pandeirinho...vou cantar mais, fazer mais teatro, experimentar outras massinhas, aprender mais crochê, tricot, a fazer flores, biscoitos, dirigir carro, fazer comidas, andar de bicicleta, nadar, dizer mais poemas para todos ouvirem, dançar as juninas... Eu vou aprender e também vou ensinar o que eu já ensino, mas vou ensinar melhor. Eu vou ser muito ocupada, porque eu gosto de estudar e conhecer muitas coisas... A mamãe me ensinou a fazer sapatos, a tricotar, crochetar, fotografar, costurar, cozinhar, pintar,desenhar, ler, escrever, plantar, fazer mudinhas, afofar os canteiros, regar o jardim, o nome das flores e das árvores, a dizer poemas, escolher autores, estudar nos livros e pesquisar assuntos, amar o dicionário, falar  francês, inglês, espanhol, italiano, esculpir, entalhar madeira e fazer xilogravuras, limpar a casa, encerar o chão, escovar tapetes, organizar armários,lavar louças, esticar lençóis gostosos nas nossas caminhas. Ah... como é bom dormir na cama limpa e gostosa! Como é bom acordar e fazer tudo o que sei fazer, a vida é linda e a eternidade é aquele cesto lindo trançado com folhas que foram verdes, que eu sei fazer com as minhas mãozinhas. e que já tem mais de 60 anos. Não te disseram que era você que tinha que fazer as coisas existirem? Que você tinha esse poder? Então! E eu estudei em várias faculdades, me especializei em muito cursos com temas diversos e ensinei tudo o que eu sei para as minhas filhas e para quem esteve ou está à minha volta. Isso é a liberdade, você ser responsável por você e assim sendo, também será pelos outros. Isso também é a eternidade. Uma delícia!
 Fernanda Correia Dias
in  Não te disseram que era você que tinha que fazer as coisas existirem?



Arpoador . Arpoador . foto Fernanda Correia Dias
Arpoador. Arpoador . foto Fernanda Correia Dias

As aves marinhas atravessaram a fotografia, na mesma direção das ondas e das nuvens.
Tudo ia para a direita inclusive eu. Clik na fotografia.
Eu pensava na etimologia da palavra escola...em grego,  ócio...tempo livre... lazer...
Pensava na palavra pedagogo, preceptor... aquele que conduz...
Pensava em Tagore e na escola que ele criou Santiniketon... com as crianças ao ar livre, debaixo de sol e sombras de árvores, conversando com o professor... Pensava em poiesis...como a atividade que uma pessoa traz o que antes, não existia... criação. Pensava nas borboletas deixando suas cascas de lagartas nas árvores...E olhando aquele céu e aquele mar e pessoas, vi que todos aqueles seres humanos naquele instante estavam vivendo no paraíso terrestre e eu também. Que a educação deveria levar a criança ao encontro daquilo que ela sente que nasceu pronta para realizar.Um mestre sensível e virtuoso apenas precisa entregá-la ao lugar que ela esta procurando... a direção...e naquilo que ela nasceu para realizar, fará intensamente e prazeirosamente e de tal maneira que aqueles que não nasceram com aquela vocação ficarão sempre admirados com a excelência e abundancia das realizações. É que uns nascem para ser grandes e maravilhosos pedreiros e construtores, outros para examinar a fauna que ataca os nascimentos das plantas e outros para ligar notas musicais em frases...Uns nascem para capturar os tons das cores, outros as flexões e sutilezas das palavras e outros equilibram sabores...assim vão os pássaros em harmonia com as ondas e as nuvens me dizendo coisas, enquanto meus olhos pastoreiam as areias, os azuis e os verdes e tudo é suave como os nascimentos das espumas. Assim também deveria ser a educação de todos os seres humanos no mundo.A harmonia de suas vocações faria a humanidade viver eternamente no paraíso terrestre.
Aves marinhas, cheias de graça, o mar é conosco, benditas são em voos entre as mulheres e benditos os frutos dos seus ventres azuis!

Fernanda Correia Dias
in Em sânscrito Santi = paz, niketon=morada