segunda-feira, 9 de junho de 2014

 Con cariño
Carmen D´Aucilio Tascheri Design Gaveteiro Fernanda
 .  Foto Fernanda Correia Dias
Carmem D´Aucilio Tascheri é muito minha amiga. Me chama: Princesa! Principessa!
Escuto sua voz me ensinando a falar espanhol puro e casto até hoje, a fazer a massa de macarrão e passar a massa na máquina até cortarmos e colocarmos para secar no varal...Carmen é cômica. Ela ri do que não dá certo. Ri da sua decepção e faz graça, conta piadas. Tem tremendo e poderoso humor. É impossível remar no bote de frente para ela, perdemos a força de tanto rir e não chegaremos na praia. Os rapazes corajosos nadando gritam: Bamos tortugas! E nós? Às gargalhadas e sem força dizemos entre nós uma para a outra, nos referindo à piadas: Pedalea.... Solta el freno...! E quase morremos de tanto rir ahogadas em nossas risas... Carmen se interessa por coisas mínimas. Me oferece uma pedrinha, uma miçanguinha, uma argolinha para os marionetes... (Eu fazia marionetes). E vejo Carmen sentada na primeira fila do auditório da PUC-RJ ouvindo atentamente minha apresentação de projeto de pré-tese para container de mate-limão. Ouço os aplausos e sua inteligencia Siciliana (Carmem nasceu na Sicília e viveu no Chile e Brasil ) na formulação das perguntas e  na mais absoluta espontaneidade quando declarou ao público: Vejo que toda a venda de mate-limão na praia está superada com este container da Fernanda. Foi aplaudidíssima. Em nossas casas ficaram as nossas pisadas com tamanquinhos Dr. Scholl subindo e descendo as inúmeras escaleras para levarmos as compras para cima ou descendo para o quebra-mar para caminharmos pela praia longamente em dias frios enroladas em saias de algodão cru e rendas brasileiras...e argolas finíssimas nas nossas orelhas... em silêncio com troca de olhares cúmplices sobre o céu, as ondas e os pássaros. Nós duas tínhamos algo de cinema mudo. Nas lojas, cercadas de desconhecidos que nos avisavam : sua mãe está ali....sua filha está lá... Éramos parecidas? Éramos. Mas a Carmem não era minha mãe. Nem parecida com minha mãe. Carmem era parecida física  e espiritualmente comigo. Me chamava de Princesa ou de Fernandita e os outros nos explicavam por que éramos muito parecidas:  Vocês são rápidas, brincalhonas, sorridentes, bailarinas e muito, muito simpáticas. .Era o que ouvíamos. Mas ela era muito especial. Carmem possuía lindas e artísticas mãos e admiráveis pés longos. Pegava nos meus cabelos e cortava e eu cortava os dela, Calçava as minhas sandálias e me fazia vestir todas as lindas roupas que criava feliz em seu atelier em casa. Também íamos ao outro atelier em frente ao autódromo da Barra para buscar as outras costuras e os artesanatos. Carmen era a primeira a me chamar por telefone e me avisar que já tinha comprado as revistas com as minhas campanhas publicitárias em páginas inteiras, duplas e triplas de moda publicadas e dizia: Lindo! Lindíssimo! Belo! Belíssimo! Me gusta muitíssimo!  Eu era diretora de criação e de arte das campanhas publicitárias de moda e ainda designer de coleções de  bolsas, carteiras, cintos e roupas! Eu criava, lay-outava e também fazia as artes-finais de  tudo. Pintávamos à óleo nos fins de semana naquelas tardes em que Roberto também queria aprender a técnica e pintava conosco e Antonio nos alegrava avisando que ganhou mais um campeonato de golf. O sol descia em silencio deixando tudo à nossa volta dourado. Mário guardava a ala de volar. Cinco horas. Hora d´el Té. Penha, a banqueteira terminava de enrolar os crepes com doce de leite, mas Carmem espetava no garfo tacos de pão francês que eu cortava e ela assava no lume do fogão com abacate e sal...Gostoooso! Penha também comia conosco rindo...pão queimado? Carmen adorava pão no fogo e preferia quando queimava, mas eu creio que era pretexto para ficar perto do fogo...Algo muito antigo alimentava sua alma! Foi Carmem que me ensinou a cantar Arroz con leche, e En alta mar havia um marinero... Carmen criou roupas para os espetáculos de ballet do corpo de baile do Chile, em Valparaíso. Criou as mais bonitas coleções de biquines em licra para o Rio de Janeiro dos anos 70 e 80, precursora foi tremendamente copiada, mas estava sempre criando mais beleza à sua volta. Chanel diria: A cópia é a consagração, ninguém copia o que não vende. Os comerciantes rasteirinhos, ávidos por comercio e lucros fáceis copiam.... São inesquecíveis os biquines com fitas de linhas de tear, búzios, conchinhas, argolas, miçangas e pérolas bordadas e na maioria bordados ou costurados pelas mãos dela. Carmen criava por amor. Criou o modelo de biquine brasileiro com o meu nome: Fernanda. Virou febre.  Nunca mais tive biquine igual. Lacinhos nas laterais, lenços triangulares nos seios, modelados por ela sobre os meus seios. Perfeitos. Hoje conhecido como Cortina - Asa Delta. Eu jogava frescobol com este biquine que não saia do lugar. Dávamos e segredávamos boas risadas quando sabíamos que algo não estava perfeito mas que os rapazes viam como genial e ouvíamos e sonhávamos com a elegância e amorosidade de Julio Iglesias cantando Por ella. Eram tempos de muito jazz, trompetes, Paco de Lucia, Quitaro, Abba, Herb Alpert, Dave Brobeck Quartet Take Five...et Lo mejor de tu vida...A veces tú, a veces yo. Pobre diablo. Amor amor amor. Pregúntale. .Carmen cantava Julio Iglesias alegre! A história da moda ao referir-se ao biquine brasileiro que não inscrever o nome da marca by Carmen ( e de sua creatore e creatrice Carmen D´Auxilio Tascheri ) como precursora e idealizadora estará faltando com a verdade da história do biquine brasileiro. Carmen perseguia a perfeição mas sem tormento. Passávamos nas costureiras para buscar as costuras e levar os cortes e pagamentos. O Rio de Janeiro era um jardim paradisíaco e a delicadeza dela era impressionante. Capaz de me trazer uma borboleta de palha ciclame e lilás com antenas pretas e montada num alfinete como broche dentro da mão fechada e ficar horas conversando comigo até me surpreender me estendendo a mão, abrindo e me dizendo que trouxe do Chile para mim e que só vi quando parecia pousada no meio da mão dela! Igual a ti, igual... La mamã apertava roupas dela para me dar de presente. Uso até hoje o shortinho amarelo de gorgurão da juventude dela e  a saia de lã marrom bordada...32 anos passados, clássicos e por isso, atualíssimos...As camisas de linho cru com gola polo e botões de madrepérola by Carmen e  pantalona com camisette de jersey estampada em coral com laranja que eram suas cores preferidas. Cai sobre meu corpo com todo o carinho que ela cortou e costurou no overlock e na colaretti para mim, na minha frente!Repito: Coral e laranja... um por do sol. Uso com  um cinto de couro com cinco medalhas de três centímetros de diâmetro de prata costuradas em couro, belíssimo e que me faz feliz por lembrar com que sonrisa ela me olhava desembrulhando o cinto do paquete! Naquele dia também ganhei uma pulseira feita por El Pappá Humberto. Uma pulseira feita de trança náutica, em cabo de nylon. Branca feito uma espuma. Sapore di mare by Carmen estava em Ipanema e os shortinhos modelados e cortados por Carmen eram perfeitos para a ginástica do Gaspar e aeróbica do Julio Veloso e os leggings também. Comprei vários e de várias cores. Os tops, os vestidinhos com pressão no ombro e listadinhos usei muito.. Um dia deixei bilhete em sua Pronte-entrega de Ipanema e não me contestó como de outras vezes... Passou mais uma semana e nada. Atendi o telefone e Humberto me perguntou se eu estava sentada...La mamã? No, no te creio... e até hoje sigo ouvindo Carmen. Hoje abri a gaveta do gaveteiro que ela criou para mim em pinho de riga e li no chão da gaveta com a letra dela:
Con cariño Carmen y Humberto

Fernanda Correia Dias
in La mamã? No, no te creio...
Para a memória de Carmen D´Auxilio Tascheri,
Para M, A, R e H Tascheri, para os netinhos 
de Carmen e para as minhas filhas Kenya e Gaya.


4 comentários:

  1. A delicadeza de deixar escrito dentro de uma das gavetas do gaveteiro Com cariño Carmen e Humberto é o máximo!
    Beijo para todos os Tascher da Fernanda

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  2. Que coisa mais linda Ferndanda, muito obrigado. Roberto.

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  3. Ah... Roberto! Em 17 fevereiro 2015 fiquei muito feliz com a poesia e sensibilidade da sua arte inteligente! Amei ver você sendo entrevistado e explicando a beleza dos drones.Vocês são rapazes muito sensíveis, inteligentes e foram muito amados por dois seres maravilhosos:La Mamã e El Papá, Carmen e Humberto! Próximo post verás na pintura que você me deu, 33 anos passados, o mesmo poeta/Roberto de hoje! Beijo você,querido, beije todos por mim, Fernanda

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  4. Então em 6 de março de 2015 , escrevi dois posts com o quadro do autor Roberto Tascheri: Pôr-do-sol!
    Bj!

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