quinta-feira, 17 de abril de 2014

Solidão
A voz da grande nuvem . Foto Fernanda Correia Dias

Ouvia muito os amigos dizerem que estavam lendo Cem anos de solidão. Eu não tinha tempo para longas leituras, precisava produzir imagens com as minhas mãos na mais absoluta solidão,  meus olhos pregados em lapiseiras descrevendo minhas novas idéias ou soluções para determinados desafios... Presos em  tintas, papéis, pontas de pincéis, penas, grafites, janelas de câmeras fotográficas, filmadoras, dirigindo fotógrafos, paginando produtos, layoutando idéias, redigindo textos, títulos, etc... Não era possível ler um livro e desenhar ou fotografar ao mesmo tempo.Ou faltavam olhos ou faltavam mãos.

Então meus ouvidos sonhavam com gravações de textos de todos os autores não lidos e eu sempre pedia aos donos de gravadoras, que chamassem atores de lindas vozes para gravarem livros, em qualquer mídia, que eu já era a primeira cliente da lista de compradores. E nada... Tanto falei que um dia apareceu, mas já era tarde...

Iniciada na poesia desde antes do meu nascimento, filha e neta de Mãe e Avó poeta, Maria Mathilde e Cecília Meirelles, a poesia é sempre o tudo que eu tive e que eu preciso. Enxuta, sucinta. De coração. Perfeita para a velocidade da minha vida. Me especializei. Priorizei. Ficou de lado o texto corrido que me esforçava para concluir a leitura.
Melhor que fossem livros de cronicas que prosseguir a leitura sempre adiada de alguns livros específicos e interessantíssimos de filosofia, sociologia, etnografia... Terminava de ler a cronica mas nunca de ler um romance. Perdia o interesse nos infindáveis parágrafos, como quem dorme lendo sem aprender a conclusão.
Mesmo daqueles livros que os amigos diziam que estavam lendo. Então eu pedia para que me contassem o que aquele romance acrescentou em suas vidas.

Quase sempre nada muito espetacular. Eram os detalhes, o modo, o pensamento mágico, sutilezas.
Eu concluía: A humana companhia.
Por isso eu empilhava os livros e andava pela casa de paredes de livros, querendo conhecer todos eles.
Mas faltavam mais olhos e mais mãos...Eu precisava ter mais cabeças para absorver em simultâneo tantas vozes em humanas companhias.

Só mais tarde, quando meu coração sabia ler, assoviar, tocar flauta  e nadar, tudo ao mesmo tempo, que mergulhei em todos os romancistas mal lidos entre eles Gabo depois que eu ouvi ele falando sobre a carpintaria de um romance:
Eu lembro da voz, lembro das mãos e dos olhos daquela palavra carpintaria nele.

E aquela história de pedras sendo transformadas em água...a população que perdeu a memória...As borboletas amarelas...A solidão como companhia, companheira, a única que realmente temos como a nossa parenta Solanda... Só ela anda...Só anda... Sol anda... dia após dia como sua unica e verdadeira companhia. Solidão. Sem. Com. Anos e anos.
Solidão? Jacinta, Garcia e benevides, bem vistes,  bien venido.

Então lembrei da minha secretária colombiana que me emprestou o livro em espanhol e da reação da minha mãe ao ler o título respondendo:
Ah... filhinha... Nascemos sós. Morremos sós.
Todo o mais é companhia, na alegria e na felicidade, na tristeza e na magia, etc...
Este todo o mais da minha mãe é genial. Ela sempre buscou o entendimento humano. Reunir. Compreender.Conviver. Estar. Ler. Estudar.
Gargalhar, brincar, pertencer, acolher. Ela sabia tudo sobre a solidão e a Solanda, nossa parenta.
Inclusive me ensinou a andar pelo mundo, vivendo, trabalhando muito, lendo e me preferindo bem acompanhada.
Eu também.
Obrigada Mãethilde,
Beijos Gabriel!
Fernanda Correia Dias
in Garcia, marques!











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