quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Fernanda Correia Dias . Fotógrafa . Notícias do Céu III

Ontem estive acompanhada de Irina Tshetsnakova.
Subi as escadas de madeira da Escola de Danças do Estado da Guanabara, que depois foi chamada de Escola de Danças Clássicas do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, segui para os camarins e de frente para o grande espelho, passei a fita de helanca pela cabeça e deixei a fita  no pescoço como um colar... Cobri minha cabeça com uma rede de teia de aranha, puxei para dentro da rede toda a minha cabeleira e depois suspendi a fita. Em seguida cobri minhas orelhas e a fita com o cabelo... Um penteado de bailarina clássica que termina com grampos e coque na nuca.
Tirei da bolsa minhas sapatilhas e já nos pés, enrolei as fitas nos tornozelos. Transferi meu uniforme azul turquesa com o símbolo da Escola de Danças do Estado da Guanabara para o cabide, deixei a mala escrita Ballet, na estante e fui para a fila, que se formava no corredor próxima à sala de Lidya Costallat e René. Fiquei aguardando a aula.
Maria Aparecida Borges Monteiro Lima, a pianista sorridente passou por mim com as partituras que nos acompanhavam a cada exercício de barra, centro, chão, diagonal...
Na minha frente as janelas entre-abertas de onde eu avistava a rua... E a infinidade de ninhos de pombos, filhotes de pombos... Pai e mãe zelosos. De pombos...
Minha professora Irina, tem olhar de garça. Asas de garça. Pernas de garça e eu também sou garça.
Compreendo perfeitamente o que ela demonstra. Faço igual. É fácil. Mas eu não quero fazer igual e tenho sede de fazer como eu já nasci sabendo... E ela percebe isso.
Então minha professora Irina Tshetsnakova, pede a pianista Aparecida um Adágio...e depois uma polca, uma mazurca...Descubro que o olhar dela me acompanha no desafio do improviso. Ela descobriu que nasci para coreografar e dançar minhas próprias coreografias. Ela descobre para mim, o que eu já sabia, porque me faz ver e sentir com meu coração ao lado do dela. Então chama Klaus Vianna. Klaus alto, grande, bonito, com manoplas e o primeiro bailarino-coreógrafo que tocou as minhas mãos. Ao vê-lo passando e repassando coreografias comigo na busca da perfeição, ouvindo Aparecida repetir aquela mesma parte da canção ao piano descubro simultaneamente que cada momento é único e que na dança como na vida, tudo se assemelha, mas nada é igual e a arte de repetir idêntico e igual, com perfeição não é a minha vocação. O espelho sabe isso. Eu posso fazer muito semelhante, uma, duas vezes, mas eu sou sempre o improviso porque a verdade é minha ânima. Irina via. Sorria, enquanto Klaus se admirava e se identificava.
Irina mora dentro de mim, com sua pele quase transparente, seus lábios de pitanga e seus olhos de céu. Klaus mora dentro de mim e eu moro dentro da manopla dele. Eu sou o tempo em mim.
Fernanda Correia Dias
in Eu, Klaus e Irina Tshetsnakova.












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