quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Fernanda Correia Dias . Fotógrafa. Notícias do Ceú I

Olhando este céu assim,  
lembro imediatamente das cadernetas escolares 
e dos boletins.
Ali, nubladas, as anotações por extenso
e na folha da palmeira 
a palma da minha mãe.
A palma para os aplausos, para escrever Muito bom!
Muito bem! Ótimo! Em letras legíveis de solidariedade,
que me deixavam comovida como sempre.
Mãe parceira, mãe leoa, rosnando para as ameaças, 
nos rastreando nos abismos.Nos arrastando para o sol das praias,
Como não trazer até hoje comigo as minhas cadernetas,
 para este céu e esta palmeira?

Fernanda Correia Dias
in Perpétuo






Fernanda Correia Dias . Fotógrafa . Notícias do Céu III

Ontem estive acompanhada de Irina Tshetsnakova.
Subi as escadas de madeira da Escola de Danças do Estado da Guanabara, que depois foi chamada de Escola de Danças Clássicas do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, segui para os camarins e de frente para o grande espelho, passei a fita de helanca pela cabeça e deixei a fita  no pescoço como um colar... Cobri minha cabeça com uma rede de teia de aranha, puxei para dentro da rede toda a minha cabeleira e depois suspendi a fita. Em seguida cobri minhas orelhas e a fita com o cabelo... Um penteado de bailarina clássica que termina com grampos e coque na nuca.
Tirei da bolsa minhas sapatilhas e já nos pés, enrolei as fitas nos tornozelos. Transferi meu uniforme azul turquesa com o símbolo da Escola de Danças do Estado da Guanabara para o cabide, deixei a mala escrita Ballet, na estante e fui para a fila, que se formava no corredor próxima à sala de Lidya Costallat e René. Fiquei aguardando a aula.
Maria Aparecida Borges Monteiro Lima, a pianista sorridente passou por mim com as partituras que nos acompanhavam a cada exercício de barra, centro, chão, diagonal...
Na minha frente as janelas entre-abertas de onde eu avistava a rua... E a infinidade de ninhos de pombos, filhotes de pombos... Pai e mãe zelosos. De pombos...
Minha professora Irina, tem olhar de garça. Asas de garça. Pernas de garça e eu também sou garça.
Compreendo perfeitamente o que ela demonstra. Faço igual. É fácil. Mas eu não quero fazer igual e tenho sede de fazer como eu já nasci sabendo... E ela percebe isso.
Então minha professora Irina Tshetsnakova, pede a pianista Aparecida um Adágio...e depois uma polca, uma mazurca...Descubro que o olhar dela me acompanha no desafio do improviso. Ela descobriu que nasci para coreografar e dançar minhas próprias coreografias. Ela descobre para mim, o que eu já sabia, porque me faz ver e sentir com meu coração ao lado do dela. Então chama Klaus Vianna. Klaus alto, grande, bonito, com manoplas e o primeiro bailarino-coreógrafo que tocou as minhas mãos. Ao vê-lo passando e repassando coreografias comigo na busca da perfeição, ouvindo Aparecida repetir aquela mesma parte da canção ao piano descubro simultaneamente que cada momento é único e que na dança como na vida, tudo se assemelha, mas nada é igual e a arte de repetir idêntico e igual, com perfeição não é a minha vocação. O espelho sabe isso. Eu posso fazer muito semelhante, uma, duas vezes, mas eu sou sempre o improviso porque a verdade é minha ânima. Irina via. Sorria, enquanto Klaus se admirava e se identificava.
Irina mora dentro de mim, com sua pele quase transparente, seus lábios de pitanga e seus olhos de céu. Klaus mora dentro de mim e eu moro dentro da manopla dele. Eu sou o tempo em mim.
Fernanda Correia Dias
in Eu, Klaus e Irina Tshetsnakova.












quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Fernanda Correia Dias. Fotógrafa. Notícias do Céu V

Na minha infância e adolescência, estes aviões sobrevoavam as praias rebocando publicidade de produtos e serviços.
Eram tiras de tecido onde as letras e marcas estavam pintadas ou costuradas numa faixa bem longa, atrás do aviãozinho.
As vezes numa tarde de praia o mesmo avião passava umas cinco vezes no céu e cada vez, uma propaganda diferente. Com cinco aviões diferentes e cada qual com cinco propagandas, nós o povo da praia, éramos comunicados sobre vinte e cinco produtos ou serviços num único dia...
O aviãozinho fazia barulho. Dava rasantes...Ou estava bem alto...flutuante...
Por ser comunicação para quem estava ou morava na praia, era uma comunicação direcionada.Específica E funcionava. Show... Festa...Teatro..Circo....e ali mesmo agendávamos a programação para o fim da tarde.
Ninguém tinha celular na praia porque o telefone celular ainda não existia. Alguém sempre tinha uma ficha de metal para avisar a um amigo por telefone público que depois da praia estaríamos no Teatro... 
Fernanda Correia Dias
in Céu azul! 




terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Fernanda Correia Dias . Fotógrafa . Notícias do Céu IV

Felícitas Barreto, passava por nós com o Tucano Arco-Íris (Oco-Kuri) e parávamos para conversar.
Era linda, com olhos muito azuis e trazia em seu visível coração humano, histórias de entendimento entre os índios e a civilização...Entre os animais e as industrias... Suas últimas tristezas estavam associadas aos olhos de ursinhos e coelhinhos e substancias que eram utilizadas em shampoos que não ardiam nos olhos de crianças ... Mas antes, ela andara pelos céus com seus maridos aviadores, corajosos, que desciam numa clareira no meio da mata, de onde eles decolariam para seguir o voo e de onde ela caminharia sozinha noites e dias para encontrar povos indígenas levando notícias da civilização. Ser Mensageira de Indio, tinha um nome que ela usava para ser identificada... Eu esqueci... quando lembrar escrevo...Ela era uma etnóloga por vocação e expansão de seu conhecimento.

Eu ainda era criança quando conversei com ela pela primeira vez e no ombro ela trazia um Tucano que era muito meu amigo.(tucanos...entre Correia Dias...ganham logo simpatia...)

 Os livros da biblioteca particular de Felícitas eram extraordinários. E os que ela escreveu, são e serão preciosos. Felícitas também desenhava e pintava delicadamente. Foi retratada por Guignard... E seu lindo rosto, as expressões e os movimentos das coreografias que criou foram fotografadas e publicadas em livros e revistas.
Para mim, Felícitas que frequentava a minha casa, fez diversas pinturas-presentes: Tamanduás, Pinguins...Tucanos... Também me recebia no apartamentinho dela... A cama era mesa para pintura. Mesa para me mostrar seus trabalhos e seus livros... Não tinha colchão. Era uma tábua branca. Bem branca que descia da parede por dobradiças e correntes. Tudo tinha um lugar.A janela do apartamentinho era também o viveiro para Oco-Kuri...o tucano que ganhou do noivo Aparabé.... Este tucano defendeu Felicitas de ladrões que invadiram o apartamento dela em Copacabana.
Felicitas tinha um carro e dirigia. Um dia , atravessando com  seu carro o Tunel Dois Irmãos na direção para a Barra da Tijuca e acompanhada de Oco-Kuri, ele se assustou, saiu pela janela do carro e voou na direção contrário do transito... Por ser mão única, Felícitas teve que fazer a volta ao fim do túnel extenso e retornar ao mesmo túnel procurando seu tucano Oco-Kuri... Nunca mais o encontrou. Este tucano já trazia o bico perfeitamente restaurado depois de quebrar num acidente...Felícitas  tinha um nome indígena que adquiriu quando viveu entre os indios: Anchu Nuno.
Felícitas sempre me abraçava quando me via e enquanto me abraçava me dizia um longo e apertado: Fer-nan-di-nha....
Este abraço que ela me dava era algo que contrariava completamente o que ela pregava: Os índios não abraçam nem beijam para não transferir doenças. São muito assépticos.
Réquiem para os índios, A alma da natureza foge da Terra...Danças do Brasil, Felicitas Barreto Libertária e Liberta, são títulos de obras escritas por ela que dançou danças brasileiras no teatro de Isadora Duncan em Paris recebendo dia após dia tempestades de aplausos!
As Revistas Life, National Geographic trazem fotos e matérias sobre Felícitas.
Ela não gostava de roupas e dizia que se sentia fantasiada por ter que usar roupas.Então chegando em casa dela, ela se despia na frente de qualquer um e ficava nua como se estivesse vestida.Na maior naturalidade.
Sem ofender ninguém. E a naturalidade era tão severa que se impunha em segundos.
De mim, ela preferia receber roupas da minha loja: shortinhos e blusinhas bem curtinhas e levinhas.Ela me dizia que eu sabia fazer roupa para o Brasil: em fibras naturais, com lindos desenhos e modelos confortáveis.
Felicitas participou das fotografias da coleção de 1988 posando para mim como modelo fotográfico.
É que eu sempre defendi a ideia de que a roupa é antes de tudo, qualidade de vida.
Ainda aos noventa e dois anos Felicitas Barreto andava pelo Rio de Janeiro e pelo mundo com os mais atualizados shortinhos e blusinhas da minha empresa.
Felícitas deixou comigo algumas dedicatórias em livros, desenhos e cartões Uma das dedicatórias de Felicitas é esta, para a minha mãe, que vivia comigo em minha casa, em Copacabana e onde as duas jogavam e escreviam diversas cartas e conversavam: Matilde    No dia que te encontre, fiz as pazes com o destino e a humanidade . Felicitas.
Deixei Copacabana  e três meses depois Felicitas  faleceu em seu apartamento aos noventa e dois anos, no dia 7 de Novembro de 2003.
Eu tive amigas com cento e cinco anos e os noventa e dois anos de Felicitas nunca nos assustaram.
Minha mãe me ensinava e eu aprendi que as pessoas que estão nas nossas vidas sabem por que estão.Nós é que não sabemos. Devemos aprender com cada uma dessas pessoas e ensinar o que soubermos.Ampara-las.Ajuda-las. Sempre. 
Felicitas faleceu no dia e mês de nascimento da minha Avó Cecília Meireles. Sete de Novembro.

Era um anjo que dançava comigo esta frase: Viver não é comer arroz e feijão! Viver não é comer arroz e feijão!Enquanto por nossas mãos passavam as obras que estávamos realizando...

Dançamos muito esta frase, tal como uma outra que danço com minhas filhas e que é de Balu em Mogli...começando assim... Eu uso o necessário, Somente o necessário O extraordinário é demais...   por isso é que eu vivo em paz...
Oco-Kuri, significa Arco-íris...ouça... oco-kuri...arco-íris...ouça e aprenda alguma coisa...Seu ouvido interior quando ouvir vai entender algo mais universal...

Fernanda Correia Dias
In Nós e  Felicitas Barreto, 
Para minhas filhas Kenya e Gaya e 
minha linda mãe Maria Mathilde

Fernanda Correia Dias. Fotógrafa. Notícias do Céu III.

As lições dos Biguás para quem quiser observar para aprender são graciosas e gratuitas.
Vá olhando o céu da Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, em direção a Linha do Horizonte... Puxam a fila os Biguás que estão menos cansados... e vão para trás da fila, para descansar, os que puxaram...Reina um equilíbrio. Uma ordem. Uma Inteligencia.Reina uma arquitetura para cada vento...E cada elemento... Um desenho de corpos para cada distância... Ah... Preste atenção nos Biguás...Eles fazem um tecido onde cada ponto tem asa para se manter no mesmo lugar, trocando a posição e conservando o desenho...Parecem parados mas estão se deslocando em relação à nuvem...em relação à proximidade que estavam dos seus olhos...
Assim também somos regidos. Por esta inteligencia de espírito coletivo, por esta dependência que temos e que devemos a todos nosso deslocamento. Por estarmos incluídos na massa negra... Este colchão cósmico que não é vácuo...é massa de onde tudo sai e para onde tudo volta...que olhando para os Biguás num céu azul é um colchão azul...
Então... Pense no que você vai escolher para escrever, para desenhar, para estudar, para caricaturar, para fotografar...Porque se você não tiver o amparo da inteligencia de espírito coletivo, por esta dependência que temos e que devemos a todos nosso deslocamento,  vai ficar sem Harmonia... E a falta da Harmonia é grave e nem todos nascem com esta natural inteligencia...Mas podem por exercício de observação e práticas de verdadeiro humanismo, conquistar.

Fernanda Correia Dias
In Lições de Biguás/Notícias do Céu. 




Fernanda Correia Dias. Acrílico sobre canvas. Aldeia Maracanã ou Meu Museu do Índio.

Aldeia Maracanã

E se os povos indígenas querem fazer um local/shopping de venda dos produtos indígenas, onde foi espaço do Museu do Indio ou do Serviço de Proteção ao Indio? Qual é o problema? Ao lado do Estádio de Futebol é adequado porque além de estar historicamente ligado à eles é local de grande visibilidade nacional e internacional. E já foi ao contrário... O Serviço de Proteção ao Indio foi inaugurado em 1910 e o estadio de futebol em 1950...  Deveriam ser parceiros! O estádio deveria ajudar aos índios!
Com verba e contínua divulgação...de amor e respeito aos índios! O estádio poderá ser ainda mais útil quando abrir seus portões e permitir que nações indígenas se apresentem aos cariocas e visitantes do Rio de Janeiro para trocar conhecimento de plantas, sementes,culturas, práticas, filosofias, etc... etc...
Estamos perdendo diariamente bibliotecas inteiras de fauna e flora que ainda não foram estudadas e até quando?
O que você pode fazer? Faça. 
Fernanda Correia Dias
In Geografia Familiar


Aldeia Maracanã ou meu amado Museu do Índio
Rio de Janeiro . Brasil

Fernanda Correia Dias . Acrílico sobre canvas . Aldeia Maracanã ou Meu Museu do Índio

Traço absolutamente perceptível no meu retrato são meus cabelos de água, pretos, lustrosos e o mais preto que eu jamais encontrei equivalência em nenhuma coisa, tinta...Até que entrando na Feira da Providencia/Riocentro/1995 e seguindo diretamente para o stand da FUNAI, trazendo uma filha em cada mão, cruzei com um grupo de seis indivíduos nus, vestidos de pintura preta e que nos cercaram, nos cheiraram ao mesmo tempo que me perguntaram:
Quanto tempo você aqui?
-Acabei de chegar... Por quê?
Você Urubu.
-Ah... sim...Meu avô paterno...
Onde está?
-Meu avô paterno? Faleceu.
Você é...
-Por isso estou levando as minhas duas filhas para conhecer a Beleza da Cultura autóctone do Brasil no stand da FUNAI.

Então, quando cheguei no stand, aconteceu algo mais surpreendente.Os clientes voltavam-se para mim, perguntando se eu falava portugues? Se eu sabia o preço dos produtos ou como eram feitos ou qual a finalidade, etc...Precisei dizer a cada um que eu sabia para que servia, ensinar como fazia, mas que eu não sabia o preço, que eu não pertencia ao stand, que eu era cliente como eles e que também estava procurando a quem perguntar sobre os preços...Mas não convenci o grupo de clientes que me respondiam ser "evidente" que eu pertencesse ao stand e que estava de má vontade de atender...
Eu sabia para que serviam aqueles objetos, porque eu conheci o Museu do Índio. Porque me interessei por seus maravilhosos e legítimos produtos de sofisticadíssimo design e inteligência quero deixar aqui um eterno pedido das vozes mais antigas da minha infância ancestral, aos que porventura lerem esta postagem de três mil anos de arte marajoara:
Para o bem do mundo, para o bem do futuro de todas as nações, para o bem do Brasil, mais importante e legítimo que o futebol, é amparar imediatamente, dignamente e generosamente a Aldeia Maracanã, o Museu do Índio com vontade política de realmente respeitar o autentico e ainda original homem do Brasil, que conserva na sua cultura a nossa Maior e Exemplar riqueza: A Inteligência.

Fernanda Correia Dias
in Geografia Familiar
Para todos os que leram até aqui e também para
as minhas filhas Gaya e Kenya,
Para o meu pai, Helio, meus avós paternos, Ana e Athanazio
meus tios Dilermana, Alba e Athanazio, meus primos...
E para os meus avós maternos, Fernando Correia Dias, Cecília Meireles e Heitor Grillo



sábado, 26 de janeiro de 2013

In Traineiras
Fernanda Correia Dias. Fotógrafa. Traineiras III

Amarela!
Preferia vermelha?
"Tanto faz...!"

O reflexo na água...olhe... são duas?
Qual delas, você prefere?
"Tanto faz...!"

Tanto faz?
"Eu não estou aqui!
Já fui e já voltei e já estou indo novamente...
Simultaneidade."
É...?
Eu sei! Eu também!!!!
Pó-pó-pó..
Eu e você, amém.

Fernanda Correia Dias
in Traineiras/Geografia Familiar





Traineiras

Fernanda Correia Dias. Fotógrafa. Traineiras

Mobilidade, simultaneidade,velocidade, instantaneidade...
Omnipresença? Zás! Vida Zás!
Aproveita! Faz alguma coisa linda para a sua vida, para a vida de alguém.Para a vida de todos! Amem!Amém!
Faz! Zás! Fazer é que faz toda a diferença.
Faz o que você sabe bem!
No mais, pó-pó-pó...

"O santo vai na proa."? Vai valer todo o sacrifício!
 "De vagar com o andor, que o santo é de barro"? Vai! Faz! Zás!Este é o destino de todos.
Pó-pó-pó...ou Mar de espelhos...pó-pó-pó.

Fernanda Correia Dias
in Traineiras




terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Fernanda Correia Dias. Fotógrafa . Traineiras .

De ir e vir fui colecionando traineiras no olhar.
Pó-pó-pó... e nossas gargalhadas nas traineiras passeando de uma praia para a outra.
Você trazia sua linhagem de marinheira, eu pensava em ir e voltar.
Você estava sempre indo e para mim sorrindo...
Eu te buscava debaixo das redes, dos toldos e dos panos.
Estavas dentro d´agua nadando...estavas na rede dormindo... estavas tranquila boiando...
De ir e vir fui colecionando traineiras no olhar
e como te conservo protegida em meu peito,
Pó-pó-pó ao ver uma traineira, sei que pó-pó-pó...ao ver, vais gostar.
Fernanda Correia Dias
in Geografia Familiar.
Para minha  Mãe Maria Mathilde




Ou isto ou aquilo de Cecília Meireles
Ilustrações de Fernanda Correia Dias
edição 1987 - 25 anos!
Livros merecem muito Amor como este aí acima! Lindo.

Encontrei outro dia na minha estante, um livrinho que pretendia oferecer a uma amiga...
Era um outro texto e que estava impresso de forma horrorosa a titulo de ter sido "para compra governamental".
Deu-me muita tristeza olhar para aquele texto publicado de forma tão feia e imprópria.
Onde estava "o ótimo"? Que leitor gostaria de receber aquela publicação? Por que o "Governo" compra impressões horrorosas? Por causa do autor? Da exuberância do texto? Mas...
Pensei: Mas com estas mesmas características gráficas, poderiam ter feito uma linda edição impressa...
Que pena! Isso é realmente uma pena!O  "Governo" deveria ser mais exigente.
Uma edição linda precisa apenas de eterno equilíbrio.
Uma edição linda, fica para sempre linda, mesmo quando está velhinha.
Então pensei que deveria arrancar a capa e fazer uma nova capa para oferecer à amiga.
E fiz. Em seguida olhei para as letras das páginas internas do texto...
Ah... estas letras horríveis, mal impressas... feitas de carregação...que horror! 
E foram distribuídos aos milhares de exemplares para pequenos leitores???
Onde está "o ótimo"? Por que o "Governo" não exige "o ótimo"? Por que os editores não avisaram aos proprietários dos direitos autorais que estavam imprimindo "aquilo"? Por que é venda "Governamental"?
Estas letras horríveis atrapalham o que estou lendo... Interferem na leitura porque me perturbam e ainda o texto cheio de gralhas?
Então decidi:  Não vou oferecer este horror. Ninguém merece.
Digitei novamente todos os textos das páginas internas e imprimi. Montei um novo livrinho em capa nova...
Pois é isso que quero dizer: Lindos livros, excelentes livros, com impressões em edições perfeitas com o tempo ficam mais bonitos!
Livros feios, imperfeitos, mal acabados, ficam para sempre feios, e podem ser salvos do lixo apenas porque o texto tem a Beleza da Excelência...Mas francamente, é um desperdício de tudo: Tempo, papel,  tinta, impressão, edição,  inclusive e principalmente falta de amor, deixar um texto maravilhoso estar impresso de forma horrorosa.
Minha mãe nos ensinou esta linda máxima que ela usava para tudo o que fazia: Quando você fizer alguma coisa, pense bem e faça o seu melhor para não ter que re-fazer. Quem faz mal-feito, faz duas vezes...
Não creio que alguns profissionais que estão habilitados ao poder fazer alguma coisa, tenham crescido ao lado desta máxima. Se tivessem crescido, não fariam livros horríveis. Não fosse a excelência do texto atirava esta edição no lixo. Não faço por amor à autora e à excelência do texto e porque no fundo do meu coração não acredito que mesmo um livrinho muito feio mereça  ir para o lixo. Merece ser amado, apesar de ser uma edição muito feia...
Colocar no lixo este livrinho não vai impedir que empresas-editoras-publicadoras prossigam
vendendo para o "governo" milhares de  livros feios justificando serem os mais econômicos.
É muito feio fazer isso com livros e com pessoas que gostam de livros.

Fernanda Correia Dias
in Livros merecem muito Amor.












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Ou isto ou aquilo Cecília Meireles edição 1987
ilustrações Fernanda Correia Dias
25 anos! Comemorando!

Fernanda Correia Dias. Detalhe no título da capa de Ou isto ou aquilo de Cecília Meireles
edição 1987 - Ilustrações e projeto gráfico de Fernanda Correia Dias

Isto aqui nunca foi um caracol... É uma lagartinha espiando do "Ou", uma possibilidade...
Mas há quem enxergue nisso um caracol e ainda escreva isso em trabalho de pesquisa científica e publique na internet. Ausência de observação.Falta de repertório imagético? Talvez...
Na capa, do livro que ilustrei esta lagartinha espia o observador, que ao estar olhando para a capa do livro estará admirando a exuberante borboleta que a lagartinha se transformou.
A borboleta está sobre fundo amarelo.
Amarelo. Pense nesta palavra.
Quantos adultos exuberantes souberam dizer corretamente esta palavra pela primeira vez que ouviram?
Não disseram ama-LE-ro antes de conseguir dizer "amarelo' simplesmente?
Muitos? Não sei, mas eu sei que quando me perguntaram que flor era aquela?, respondi:
alamanda amalera!
Alamanda que era mais difícil saiu certo...Mas o amarela.... Precisava de ajuda...Claro que fui ajudada!

Escolhi a cor da capa do livro:Amarela.
Um bom começo para quem  vai ler Ou isto ou aquilo.

Fernanda Correia Dias
in O livro do livro ou como ilustrei Ou isto ou aquilo de Cecília Meireles, edição 1987.



Ou isto ou aquilo/Cecília Meireles edição 1987
Fernanda Correia Dias. Ilustrações das folhas de guarda
Comemorando 25 anos


Folhas de guarda da edição do livro Ou isto ou aquilo/Cecília Meireles
Ilustrações de Fernanda Correia Dias

As fotos das ilustrações acima não trazem as imagens integralmente. Ficou faltando pedacinhos
mas algumas diferenças podem ser notadas imediatamente pela evidencia.
São sete o total dos erros...seguem três de sete...
1- Grande Margarida x Antúrio
2- Menina sem gatinho x Menina com gatinho
3- O braço dobrado do meu avô Fernando Correia Dias...
etc... etc...
Então eu penso que quando alguém resolve escrever seriamente sobre alguma coisa que realmente examinou deve ter tido como pré-requisito o exercício da observação. Não?
Saber observar em comparação, levantar evidencias, trazer uma bagagem de minúcias de percepção é treinamento.
Ninguém adquire sem ter passado pelo exercício. Não é melhor quando esta prática é iniciada na infância?
Não consolidaria melhor o adulto que pretende ser doutor em alguma coisa?
Saber observar é treinamento básico para quem quer concluir alguma coisa que tenha alguma importância.
E isso deve começar na infância.
Minha mãe me ensinou que a pressa é inimiga da perfeição, e isso deve justificar muitos trabalhos ruins que leio pela internet sobre comparações de edições do livro Ou isto ou aquilo/Cecília Meireles.
Ser neta da minha Avó-autora de Ou isto ou aquilo e ter ilustrado o referido livro me mostrou quem era o mercado editorial. Um mercado que pode oferecer o ótimo, a excelência, mas que enfrenta a miséria e a pobreza que atravanca o Brasil. Milhares de crianças morrem ainda de inanição na primeira fase de suas vidas, ou quando não morrem são vítimas da má formação cerebral.
Isso também deve justificar por que os autores, ilustradores, editores, pais amorosos são aviltados com a falta de equivalência monetária aos seus esforços. Ainda temos que resolver a inanição e a miséria ao lado da educação.Por isso nascem livros e edições  horrorosas, descartáveis e até sem nenhuma importância para a formação das gerações futuras. E são comprados aos milhares, como que se quantidade fosse sinônimo de qualidade.Não é. Antes fosse.Ao longo de vinte e cinco anos ainda são horrorosos os contratos de edição, os textos, as ilustrações,os livros... Um mundo que depende de vontade política de acabar, antes de tudo, com a fome.Que ainda não acabou. Todo o mais é decorrência inclusive a formação cerebral de autores, ilustradores, editores, livreiros, etc...etc...
O que deve justificar que em 1987 eu recebi, depois de três anos de ilustração o correspondente ao valor de uma caixa de lápis de cores nacional e não reclamei porque não dependia daquele dinheiro para fazer o meu ótimo, nem para seguir comprando caixas de lápis de melhor qualidade.
Quando o Governo paulista comprou quarenta mil exemplares, ou numero similar, fez a exigência de receber a compra em papel diferente do couché (o mais barato) e a capa que era dura, ficou em cartão mole...(também mais barato). As bibliotecas paulistas receberam gratuitamente do governo e ainda assim compreendo o gesto mais louvável que imprimir este lindíssimo texto sem nenhum esforço pelo ótimo.
Faço a minha parte sempre que posso, inventei um projeto que ano passado concluiu vinte anos em que me esforcei em divulgar autores/obras/editores/ilustradores/tradutores nos suportes do dia à dia e em português: Fronhas, vestidos, lençois, camisas, pratos, bules,almofadas, calcinhas, paletós, vestidos de festa, echarps, meias, toalhas de banho, jogos americanos, sandálias, aventais, etc... etc... Este trabalho que tem por objetivo contribuir com os esforços de todos ainda ajudou comunidades com fome.
É assim. É preciso oferecer sempre o ótimo.E cada um que faça a sua parte.
Pode começar aprendendo a observar as diferenças.

Fernanda Correia Dias
in O livro do livro ou como ilustrei Ou isto ou aquilo de Cecília Meireles edição de 1987










domingo, 13 de janeiro de 2013

Ou isto ou aquilo Cecília Meireles Ilustração Fernanda Correia Dias. 1987
Comemorando 25 anos!
Ou isto ou aquilo . Cecília Meireles. Ilustrações Fernanda Correia Dias . 1987

Reuni tudo o que eu sentia de mais autêntico para criar o objeto que seria o livro.
Transformei a folha em branco numa bandeja. Fui organizando. Decidi oferecer ao futuro leitor, ao lado da excelência do texto, os valores que recebi pessoalmente de minha Avó materna  e Madrinha de batismo Cecília Meireles. 

Livro é porta, janela, casa, lugar para morar e ainda lindas paisagens coloridas, horizontais e infinitas, como aquelas que minha Avó Cecília ia desdobrando para eu ver o mar, o céu e aprender a identificar cada nome, até aquelas que ela levantava uma pequena folha de papel e eu via muitas formiguinhas reunidas e contávamos uma por uma...ou aqueles que recortávamos bandeiras ou pintávamos os trajes típicos de cada país com lápis de cor. Ou aqueles  em que aprendi a cantar canções, os que ouvia histórias que ela ia lendo... E me lembrando de nossas brincadeiras de eco...Neta/poeta, concordas/sem cordas... Menina/bailarina... Calçando a luva sobre o anel que não podia tirar do dedo porque era jóia... 
Então, fiz do papel uma bandeja-livro para a ascese do aroma de ouro dos sentidos e para a delícia saborosa do texto quando atinge a dimensão de estar sendo compreendido. Tal como era e é para mim, dentro da minha própria cabecinha. 
Aquele terceiro e quarto raciocínio que não era a voz, o baton, o olhar, a essência do corpo, o hálito, a entonação, nem o que ela lia, mas a revolução que aquilo fazia em mim, no que eu entendia se acomodando dentro de mim, do que eu já trazia em mim para perto dela, na minha cabecinha, dialogando internamente e em diversos estados emocionais, tais como ebulição, alegria, gargalhada, ternura, curiosidade ou sobrancelhas contraídas ou surpresas sinalizando interrogações e exclamações.. 
Fiz uma bandeja tal como a minha avó parecia ter nas mãos quando saboreávamos juntas, os lindos textos dos livros de sua biblioteca. Uma bandeja com frente, recheio e costas: Na frente- a capa- desenhei a borboleta em seu esplendor e simultaneamente a própria borboleta em estado de lagarta... antes da metamorfose...sendo observada por ela mesma, entre as letras do título:Ou isto ou Aquilo. Na quarta capa, a Lagarta sorrindo... sozinha...confiante, provocando o observador, sendo aquilo antes de ser isto-capa. Lembrando-me que ninguém passa incólume por uma experiência.Toda experiência é modificadora.Dá musculatura nas asas. Não?
E nunca mais  é possível ler o mesmo livro da mesma forma... Mesmo quando crescemos ao lado do livro, vamos observando a pessoa que éramos, o entendimento que tínhamos e as novidades do "agora"....E percebemos ao mesmo instante, como mudamos ou o que nos mudou e o que ainda está nos modificando ali no livro, ainda mais...!.
No miolo, -recheio da bandeja- ou seja,  as cento e sessenta e cinco páginas policromadas foram tratadas por mim, como a metamorfose, a transformação, um lindo arco-íris, uma escala de cores... passando até pelo piano preto, onde vi e ouvi muitas crianças lendo e solfejando a partitura e tocando a cançãozinha...ou cantando com os pais e avós pianistas...E isso é mais explícito, quando no cantinho de cada  página do livro fiz um cineminha que só é percebido por crianças (minha mãe percebeu, claro!), nunca por adultos
Cinética: fiz um pontinho/ovo passar por larva/lagarta, pupa e borboleta...!
Para estruturar o miolo, relacionei todos os poemas que naquela ocasião (1982) encontrei em edições anteriores e distribuí de forma a sonhar... isto... aquilo.... Um exemplo? Bolas/Bolhas; Dulce/Menina trombuda, etc... e tratei as ilustrações de longos poemas com a mesma premissa: isto... aquilo..E o pensamento de quem lê, ouve, vê...Fixei instantes em meia-páginas ilustradas que transformavam as páginas anteriores e posteriores...a vida passando dentro do livro...
Porque relacionei todos os poemas que encontrei nas edições anteriores e porque elas não traziam os mesmos poemas em todas elas, ao inseri-los, ampliei a quantidade de poemas. Sempre pensando no princípio de oferecer o ótimo.
Na guarda, e na folha de rosto, um retrato da família a cores e outro parecido, em preto-branco. Um jogo de sete erros. Porque olhar para dois retratos é procurar reconhecer, o que, quem, quando...E o “instante” está permanentemente no livro. Nos dois retratos que são amorosamente  impossíveis, porque Incluí simultaneamente: avó-linda entre suas três filhas e a mesma avó-viúva presente.A mesma pessoa no mesmo retrato... Trisavó-bisavó... que soube que resmungava nhem-nhem-nhem ao lado de bisnetos e tri-netos que não conheceram... Avô-pai e Avô-padrasto... netos em idades próximas as idades das próprias mães...  e um cachorrinho coxo... O retrato impossível é imediatamente compreendido pelas crianças sensíveis que descobrem os “erros” que eu cometi propositadamente para diverti-las. E ficam ali horas observando e aprendendo a identificar bailarina, menino... vovó, vovô...moça... viúva... guarda-chuva e vão balbuciando um texto...
Então, na outra página fiz um autorretrato ao lado da ficha bibliográfica e na seguinte fixo a borboleta como sólida escultura e minha Avó Cecília aparece para escrever seu próprio nome: Cecília Meireles. Transformando o efêmero em permanente, tal como ela fez quando escreveu sobre a Elegia à pequena borboleta...
... Era ela que insistia que à criança só devemos dar o ótimo.
Fiz uma bandeja. Dei o meu ótimo. Para finalizar o recheio da bandeja, lembrei-me de uma brincadeira que ela fazia comigo: Concordas ou sem cordas?
Então criei um banco de palavras para o leitor ampliar o vocabulário.
Você sabe o que é giesta? Quer saber imediatamente? Vá buscar o dicionário...
Sentiu que faz diferença esperar para saber? Agora sinta: Giesta é um arbusto com flor amarela... E as crianças olhavam para mim e para dentro de si mesmas, me olhavam e sorriam!...Deve ser o que você está fazendo agora. Ampliando sua curiosidade e vocabulário não é? Então, releia o poema...ou leia o Banco de palavras ou isto ou aquilo para encontrar vela ou vela... de barco ou de pavio?... 
Dei o meu ótimo. Três anos ilustrando. Entreguei os originais na editora todos de uma única vez. O editor recebeu perceptivelmente fascinado. Uma honra para mim, atender ao pedido de minha mãe Maria Mathilde de fazer o meu trabalho sem a interferência de editores.
Dias antes da impressão fui chamada para uma reunião de livreiros e outros e ouvi as criticas de  L.S. que na ocasião criava polemicas sobre "tesourinhas". Não aceitei a polemica e mantive as "tesourinhas" que abriam janelinhas...libertavam figurinhas para albinho do poema Figurinhas, para o quebra-cabeça.
Uma ilustração foi subtraída da edição. A bailarina não dança como dançava...e Laura fugiu nua numa borboleta azul! Quando impresso, minhas duas tias maravilhadas me parabenizaram muito felizes.   
Quem tem a edição de 1987 não empresta, deixa para neto, sobrinho, filho, em testamento. Recebi Menção Honrosa da Camara Brasileira do Livro pelas ilustrações, mas o maior premio me deu minha mãe que combinou comigo de não revelar para as minhas filhas antes que elas soubessem ler, que eu era aquela... 
(Mesmo quando eu observava minhas filhas escolherem para companhia este livro entre filmes, brinquedos e centenas de livros!) Quando questionadas: por quê? respondiam: Eu adoro este livro! E não sabiam que eu a minha Avó Cecília éramos autoras.Levaram para a aula de biblioteca diversas vezes . Só quando aprenderam a ler me perguntaram se eu era aquela mesma Fernanda... Por quê? porque leram o nome da Bisavó e nome de Fernanda na capa do livro... Era eu?
 E diante do sim me disseram: Me ensina a fazer livro como você faz? Mas vocês sabem fazer livro... Mas eu quero fazer como você faz..(impresso) .E fizeram.E fazem. 


Fernanda Correia Dias
in O livro do livro ou como ilustrei Ou isto ou aquilo. Cecília Meireles. 1987.